Para tempos novos o "conceito" é caro!

Quando eu era menino, sempre via passar por minha rua uma menina, que não tinha muito o que vestir, já que sua família era por demais pobre e não tinha como lhe vestir adequadamente. E para ir para a escola ela usava algumas roupas nem tão agradáveis assim. No entanto ela se sentiu feliz quando ganhou de uns vizinhos uma saia de colegial azul, uma camiseta branca e uma sandália. Assim todas as manhãs, por todo aquele ano letivo, ela ia feliz a escola, com aquela mesma roupa. Até que um dia, um moleque disse que ela usava a "fardinha" (no interior de meu estado farda é o mesmo que uniforme), e desde então assim ela passou a ser chamada por outros. Fardinha. Isso a incomodava bastante. Por muitas e muitas vezes ela não se juntava aos outros grupos por ter vergonha de ter vindo a aula naquele dia, com a fardinha. Naquele mesmo período ganhei de um tio um presente que estava fazendo a maior onda, um tipo de jogo muito conhecido, o jogo do resta um (quem é de minha época sabe do que estou falando). O sino do recreio tocou, todos foram para a diversão, mas ela não. Eu então peguei o joguinho e a convidei para jogar comigo. Ela concordou. Foi muito bom! Mas o chato é que ela sempre conseguia deixar três ou dois pinos, enquanto eu que não tinha pego a manha ainda, deixava por volta de seis ou oito peças, e quando estava com mais sorte, quatro. Nos tornamos bons amigos.

Essa menina cresceu, e hoje é uma das mais lindas que eu conheço naquelas bandas. Aos quinze anos foi indicada como miss, concorrendo pela escola em que estudava, depois defendeu a cidade, ganhando em primeiro lugar. Parou a carreira em tempo, casando-se depois com um advogado conhecido da região. Até onde eu sei a menina Ana Paula de Souza, hoje é mãe de três belos filhos. Continua casada, mora na capital de meu estado. E vive muito bem!

Conheci um menino que sempre vivia se "escondendo" das pessoas. Inteligente e aplicado. Escrevia muito bem e suas notas eram as melhores numa escola federal em minha cidade. Filho de pais influentes da região, tinha porém um dilema. Sua família além de pertencer a elite da cidade, ainda era católica assídua de todos os principais eventos. Do tipo em que se soubesse que existisse uma festa, essa família não podia faltar. Ele, no entanto era mais calmo e calado. Seu tipo físico? Era gordinho. E depois com o tempo foi-se notando as mudanças peculiares em sua voz e modo de falar. O bom e educado, estudioso inteligente garoto, além de "gordinho" era gay! Lembro-me bem que quando isso veio à tona, em pouquíssimo tempo o garoto foi logo recambiado para a capital, de onde depois saiu para outros estados e assim por diante. Eu tive o prazer de o encontra anos depois, pela internet, numa dessas buscas que fazemos para encontrar uma pessoa conhecia e encontramos outra e assim por diante. Está na casa de seus trinta e poucos anos. Tem uma profissão definida. Mora só atualmente depois de ter passado por alguns encontros e desencontros entre namoros e envolvimentos que não deram muito certo. Diz-se feliz e realizado atualmente com o que possui e da maneira que vive.

Quando eu era evangélico (sim, já fui!) ainda adolescente, e estava meio que caminhando as descobertas e tudo o mais do que é realmente a vida, usava diariamente calças compridas e camisas de mangas longas. E de modo algum me permitia sequer usar uma bermuda, uma vez que a doutrina da igreja não aconselhava, já que Jesus podia voltar a qualquer momento e nos levar para o céu. E eu não podia estar "despreparado". Assim foi durante um bom tempo, quando finalmente, comecei a argumentar as coisas ao meu redor e perceber que Deus, o criador maior, está totalmente acima de algumas besteiras que nos fazem acreditar.

Para mim foi maravilhoso e um pouco estranho, quando comecei a usar roupas "normais" como todos os outros moradores duma região privilegiadamente litorânea. Sou nordestino do litoral norte de Pernambuco. E posso afirmar que temos muitas belezas naturais das terras de onde eu venho. Mas, isso não vem ao caso. Hoje eu me olho no espelho e vejo que sou um moreno com minha beleza peculiar. Mas é claro que nem sempre eu me via assim. Em alguns instante eu me olhava e não me achava tal como hoje. Só depois passei a me amar e me respeitar primeiro. As opiniões futuras depois, que fossem como fossem não iriam me atingir.

Mas, nem sempre as coisas são perfeitas como se quer. Muitas vezes a mídia e a sociedade, o meio em que nos encontramos nos impõe uma forma de nos ver que ao invés de nos ajudar é a causa real de nossas dores interiores e nossa falta de desenvolvimento. Infelizmente o "conceito" de alguns, nos afeta de tal modo que passamos a nos ver como verdadeiros lixos humanos. A sociedade diz que para ser feliz tem que ser magro ou magra, ter cabelos lisos, andar alinhadinho, e coisa e tal. E nesta leva, muitas pessoas vão deteriorando seus corpos, perdendo suas imagens. Sendo o que na verdade não são para simplesmente "agradar". Mas, chega um momento em que agradar é mais perigoso do que se possa imaginar.

Todo mundo sabe da infeliz repercussão que teve as transformações do milionário cantor Michael Jackson. Sua busca incessante para estar impecavelmente lindo foi uma das razões dele não estar mais entre nós, no mundo dos vivos. Outras pessoas, nem tão famosas assim, e falo trazendo para dentro dos bairros e cidades mais inferiores, que a sociedade certamente nem dá conta, lutam incansavelmente para mostrar para aos outros que são lindas. Infelizmente por fora. Toda semana são gastos e mais gastos com cabeleireiros, e coisa e tal. O mundo dos cosméticos são os que mais vendem e vão sempre estar em alta todos os anos no ranking de vendas. Algumas gastam o que não tem para comprar a roupa da moda, o que a loja coloca nas vitrinas. Isso é claro que as satisfaz por fora. Mas e por dentro delas, como será que estão? Acho que a pergunta mais apropriada mesmo seria: quanto custa sua beleza? Não sei se é o seu caso, mas a maioria dos seres humanos são tachados de ridículos e antiquados se não se dão ao luxo de vestirem a grife da moda, a roupa que tá bombando no momento.

Uma conhecida minha, moradora numa cidade próxima da região metropolitana de Curitiba tinha estampado no seu msn um busto daqueles com uns peitões avantajados com a frase: um dia terei um desses! Eu pensei que era alguma tara sexual, que ela tinha se tornado lésbica, o que seria menos mal. Perguntei e ela me disse que ia colocar silicone para aumentar os seios, pois não estava satisfeita com os que tinha. Perguntei sobre a opinião do marido e ela falou que ele simplesmente disse que era legal. Já uma outra menina disse que não ia a balada da ultima sexta feira por que justamente naquele dia tinha ido ao cabeleireiro aplicar luzes e não saiu como ela esperava. Queria que fosse igual ao cabelo de uma guria que esta aparecendo numa novela que ela gosta.

Vejam bem que eu não tenho nada contra a beleza nem contra cosméticos e outras coisas mais. Acredito que as pessoas que são lindas tem que buscar sim serem mais lindas ainda, e as que não são tão lindas tem o direito de prezar e buscar uma beleza que lhe adeque  Nem todo mundo é lindo. Assim também como não temos que nos submeter a feiura por uma falsa ideia de humildade. Estou aqui falando apenas das pessoas que infelizmente perdem suas identidade em busca de uma beleza que lhe aplicam, que lhe vendem, sem pensar em si mesmas enquanto personalidade  Estão tratando por fora o que deviam fazer por dentro. E esse é o problema de um número enorme de pessoas que simplesmente se deixam levar. Tipo-maria-vai-com-as-outras.

O que infelizmente acontece é que ainda apontamos aquele cara e aquela menina que é gay, ou o senhor que esta de caso com uma guria de vinte anos, ou a quarentona que se envolveu com o rapaz de dezoito, ou ainda aquela senhora que passou anos sofrendo a vergonha de ser chifrada pelo marido, no dia que resolve soltar a franga e é descoberta é logo tratada como uma mulher descarada, sem vergonha, etc... Ou seja, a beleza ou o que pensamos sobre os outros (nunca sobre nós mesmos) é um conceito que sinceramente deve ser antes de mais nada avaliado com cuidado sobre o que estamos julgando.

Daqui a uns dias vamos estar passando na rua e encontrar a seguinte coisa, de uma pessoa em conversa com a outra;

- Oi amiga tudo bem? Lábios novos hein... Aposto que é aquela nova fórmula de botox anunciado na TV, essa semana?

- Olá tudo bem? Menina como você está linda! Quanto custaram estes olhos novos? E estes peitos tem quanto de silicone? E quanto mais você vai aplicar? Nossa, vai me dizer que essa tua bunda foi encomendada de uma clinicazinha de quinta, aqui mesmo no Brasil?

Pois é! Para tempos novos...

Essa postagem é do dia 02 de setembro de 2010, quando ainda morava em Curitiba-PR. Trouxe-a de volta por acreditar que a mesma tem o seu fundo de verdade, e aproveitando para relembrar algumas postagens antigas.

Tenhamos todos uma ótima semana pela frente com o desejo de muita paz, sempre!